segunda-feira, julho 21, 2008

Conto: O pianista



Estou adorando as fotos do Tom. Uauuuu como era lindo! Uma vez o vi de blaiser na rua, fiquei parada olhando. Lindoooo, foi na década de 70. Para quem não sabe ainda, já contei, ele morou na minha rua, eu no número 97, ele no 107, mas ele já estava fora, a filha Elizabeth mora lá. Quando saí do Rio ela morava, acho que não vai se desfazer daquele apê. Há muitas histórias ali. è artista plastica, moça muito discreta e educada.


Este conto eu fiz pensando no concurso do Estadão, mas só podia mandar um, enviei o que coloquei no post anterior.



O pianista


Ele disse, parando o carro em frente ao meu prédio:
"Você sabe o quanto gosto de você, mas não daria certo, melhor ficarmos apenas amigos".
Me beijou as faces, eu queria mais, sempre quero mais.
Em frente à porta, a mão dentro da bolsa não encontrava as chaves. Uma sensação de abandono me inundou. Entrei e me joguei no sofá chorando. O cão veio me lamber, afastei-o. "Sai, Zampa, sai!"
Não sei quanto tempo se passou. A sala, antes na penumbra, foi ficando nítida. Não queria que amanhecesse. Cobri os olhos com as mãos. O cão veio novamente me cheirar, afastei-o de novo: "Sai, Zampa!".
Poderia tomar todos os comprimidos encontrados pela casa, ou abrir o gás do banheiro. Ou as duas coisas. Poderia apagar ali. Ele ligaria dois dias depois, ninguém atenderia, ligaria no dia seguinte. Nada. Uma semana depois, talvez batesse à minha porta e sentisse o mau cheiro do corpo putrefato. Eu me vingaria.
Mas, não, eu não queria apodrecer num apartamento em Ipanema.
Acabei adormecendo no sofá, despertei, passava do meio dia, o corpo doído, o vestido amarrotado.
Deitei encolhida na cama, a cabeça envolta pelo cobertor de lã.
Era domingo, ninguém me ligaria. Nem ele.
Já anoitecia quando levantei com fome. Dei comida e água para o cão.
"Zampa, desculpe, mas hoje você não vai descer". Disse abraçando-o, as lágrimas brotando.
Liguei a TV e vi, durante horas, qualquer coisa.
Poderia telefonar e dizer que o amava, que não viveria sem ele. Não adiantaria.
Fazia calor naquele início de verão. As janelas abertas davam para um pequeno prédio de onde vinha o som de música. Alguém tocava piano e cantava. Debruçada, ouvi:

“Chega de saudade
...Vamos deixar desse negócio de você viver sem mim
Não quero mais esse negócio de você longe de mim”...

Fechei a janela quando amanhecia.
Voltar para casa passou a ser prazeroso, imaginava um homem belo ao piano.
Meses se passaram. Um dia, ao passar pelo porteiro a caminho do trabalho, perguntei:
- Seu Zé, o Senhor sabe quem é que toca piano aqui no prédio ao lado?
- É um tal de Tom Jobim, a senhora conhece?
Nunca mais dormi de janelas fechadas.
O amor antigo ficou esquecido. Meu amor passou a ser o pianista do prédio ao lado-Tom Jobim.


PS: Se ainda não leu o conto anterior, leia, acho melhor que este, mais leve. Se é que eu sei fazer algo leve :)

Amanhã vou colocar o conto d Betão. Ah! como vêemos contos precisavam conter a frase da música, que está ai nos dois contos.

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