Ontem foi um dia inquietante.
À noite iria rever João Bosco depois de muitos anos. Estava se apresentando no teatro daqui.
Meu irmão disse:
- Não vai te reconhecer!
Retruquei lembrando as vezes que nos vimos. Não foram muitas, umas dez, sabia que poderia me reconhecer, mas, pensava: na época eu usava cabelos cacheados grandes, hoje são grisalhos e curtos.
Trabalhei até a hora do show, cheguei antes de meu filho e namorada, que me acompanhariam.
João está com a mesma voz potente e bonita. Cantou o tempo todo apenas acompanhado pelo seu violão, em pé.
Entre uma música e outra, contava sua história.
Estudante de engenharia, mineiro de Ponte Nova, morava em Ouro Preto quando conheceu Scliar, que o presentou Vinícius, em 1967- ano que o encontrei com outros três rapazes, na duna maior de Cabo Frio.
Era um passeio obrigatório para turistas e eu estava com duas amigas de Curitiba. Lembro bem da cena porque tenho uma foto de maiô preto- o único que usei durante anos- na duna branca. Eu tinha 20 anos, ele 21.
À noite fomos para à casa de Scliar, e, naturalmente, cada uma das moças ficou acompanhada por um dos rapazes. Scliar era amigo de meu irmão e eu o conhecia há anos também, passávamos os reveillons lá na bela casa colonial à beira do Canal de Itajuru em Cabo Frio. A casa dele era visitada pela beleza e arte. Havia e devem estar lá ainda- hoje é o Instituto Carlos Scliar- quadros de muitos pintores brasileiros, as paredes cobertas, coloridas. Esculturas de artesões belíssimas. O cheiro de madeira, o chão encerado, bem cuidado.
Estes encontros duraram algumas semanas, sempre aos fins de semana. João não havia levado o violão para Cabo Frio e ficou aqueles dias com o de minha irmã, que engatinhava nas cordas.
Íamos à boite do Hotel Palace, que era a da moda. Caminhávamos pela areia, muitas vezes. Não havia risco nenhum- a não ser umsiri pegar o pé de alguém.
Um dia eu não fui e João ficou com uma colega minha.
Tivemos uma breve DR, ele se justificou e voltamos a ficar juntos. Nada de sexo, apenas uns beijos.
Nesta época João ainda não havia lançado o primeiro disco, Agnus Sei (1972), vendido pelo Pasquim, o folhetim.
Alguns anos se passaram, João começou a ficar famoso, eu não o vi mais.
Em 70 fui morar no Rio, Ipanema. Uma amiga da faculdade namorava um rapaz de Ponte Nova, fui passar um feriado lá com um namorado, Fernando Bento, artista plástico, também amigo de Scliar. João fez uma show naqueles dias na sua cidade natal e fomos todos vê-lo. Já era conhecido, Elis já havia gravado.
Lembro que uma vez, fui sozinha ao teatro do shopping da Gávea, como não tinha dinheiro para pagar o ingresso, chamei-o e pedi para assistir. Sentei numa cadeira que colocaram na primaira fila.
Olhando para trás fico um pouco constrangida com a minha ousadia- eu achava que tinha direito a vê-lo, simples assim, na minha cabeça da época. Foi um dia inesquecível, pois Elis Regina deu "canja" cantando " O bêbado e o equilibrista". ainda bem que fui ousada!
João corria no calçadão da praia, encontrei-o várias vezes. Eu interrompia sua corrida- imaginem!- para cumprimentá-lo.
Nos encontramos mais uma vez no Luna bar, participei de um grupo grande, onde estava Mario Prata, e Fafá de Belém.
Eu me sentia meio peixe fora d'água, mas tinha uma passividade na época, que me fazia permanecer nos lugares até... hoje vejo isso.
Ontem tudo isto veio à tona, Scliar, Cabo Frio, os amores não vividos. Não fui apaixonada pelo João, havia um distanciamento nele. Depois que fui morar no Rio eu me perguntava se ele já tinha compromisso com a mulher com quem casou, na ocasião.
A vida é irônica. Trêzes anos depois do encontro com Bosco, eu me enamorei perdidamente por um dos outros rapazes daquele dia das dunas. Devo um grande amor ao Scliar, que à distância esteve presente na minha vida durante muitos anos, sem saber.
Ah! João me chamou de querida quando me reconheceu e me abraçou. Disse que moro no paraíso. Acho que eu aproveito pouco o paraíso.
Ele estava saindo para o aeroporto, eu queria ouvir mais, saber o que ficou daqueles dias, mas não deu tempo.
À noite iria rever João Bosco depois de muitos anos. Estava se apresentando no teatro daqui.
Meu irmão disse:
- Não vai te reconhecer!
Retruquei lembrando as vezes que nos vimos. Não foram muitas, umas dez, sabia que poderia me reconhecer, mas, pensava: na época eu usava cabelos cacheados grandes, hoje são grisalhos e curtos.
Trabalhei até a hora do show, cheguei antes de meu filho e namorada, que me acompanhariam.
João está com a mesma voz potente e bonita. Cantou o tempo todo apenas acompanhado pelo seu violão, em pé.
Entre uma música e outra, contava sua história.
Estudante de engenharia, mineiro de Ponte Nova, morava em Ouro Preto quando conheceu Scliar, que o presentou Vinícius, em 1967- ano que o encontrei com outros três rapazes, na duna maior de Cabo Frio.
Era um passeio obrigatório para turistas e eu estava com duas amigas de Curitiba. Lembro bem da cena porque tenho uma foto de maiô preto- o único que usei durante anos- na duna branca. Eu tinha 20 anos, ele 21.
À noite fomos para à casa de Scliar, e, naturalmente, cada uma das moças ficou acompanhada por um dos rapazes. Scliar era amigo de meu irmão e eu o conhecia há anos também, passávamos os reveillons lá na bela casa colonial à beira do Canal de Itajuru em Cabo Frio. A casa dele era visitada pela beleza e arte. Havia e devem estar lá ainda- hoje é o Instituto Carlos Scliar- quadros de muitos pintores brasileiros, as paredes cobertas, coloridas. Esculturas de artesões belíssimas. O cheiro de madeira, o chão encerado, bem cuidado.
Estes encontros duraram algumas semanas, sempre aos fins de semana. João não havia levado o violão para Cabo Frio e ficou aqueles dias com o de minha irmã, que engatinhava nas cordas.
Íamos à boite do Hotel Palace, que era a da moda. Caminhávamos pela areia, muitas vezes. Não havia risco nenhum- a não ser umsiri pegar o pé de alguém.
Um dia eu não fui e João ficou com uma colega minha.
Tivemos uma breve DR, ele se justificou e voltamos a ficar juntos. Nada de sexo, apenas uns beijos.
Nesta época João ainda não havia lançado o primeiro disco, Agnus Sei (1972), vendido pelo Pasquim, o folhetim.
Alguns anos se passaram, João começou a ficar famoso, eu não o vi mais.
Em 70 fui morar no Rio, Ipanema. Uma amiga da faculdade namorava um rapaz de Ponte Nova, fui passar um feriado lá com um namorado, Fernando Bento, artista plástico, também amigo de Scliar. João fez uma show naqueles dias na sua cidade natal e fomos todos vê-lo. Já era conhecido, Elis já havia gravado.
Lembro que uma vez, fui sozinha ao teatro do shopping da Gávea, como não tinha dinheiro para pagar o ingresso, chamei-o e pedi para assistir. Sentei numa cadeira que colocaram na primaira fila.
Olhando para trás fico um pouco constrangida com a minha ousadia- eu achava que tinha direito a vê-lo, simples assim, na minha cabeça da época. Foi um dia inesquecível, pois Elis Regina deu "canja" cantando " O bêbado e o equilibrista". ainda bem que fui ousada!
João corria no calçadão da praia, encontrei-o várias vezes. Eu interrompia sua corrida- imaginem!- para cumprimentá-lo.
Nos encontramos mais uma vez no Luna bar, participei de um grupo grande, onde estava Mario Prata, e Fafá de Belém.
Eu me sentia meio peixe fora d'água, mas tinha uma passividade na época, que me fazia permanecer nos lugares até... hoje vejo isso.
Ontem tudo isto veio à tona, Scliar, Cabo Frio, os amores não vividos. Não fui apaixonada pelo João, havia um distanciamento nele. Depois que fui morar no Rio eu me perguntava se ele já tinha compromisso com a mulher com quem casou, na ocasião.
A vida é irônica. Trêzes anos depois do encontro com Bosco, eu me enamorei perdidamente por um dos outros rapazes daquele dia das dunas. Devo um grande amor ao Scliar, que à distância esteve presente na minha vida durante muitos anos, sem saber.
Ah! João me chamou de querida quando me reconheceu e me abraçou. Disse que moro no paraíso. Acho que eu aproveito pouco o paraíso.
Ele estava saindo para o aeroporto, eu queria ouvir mais, saber o que ficou daqueles dias, mas não deu tempo.
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