“Coração Imobiliário”
Um dia Carlos Drummond me telefonou e disse:
- Posso publicar uma crônica que fiz para você?
- Claro, é um prazer, querido!
- Chamo a personagem de Cristiane para você não ser
identificada.
Dias depois, estava lá a crônica “Coração imobiliário” no
Jornal do Brasil.
Eu nunca fiz cópia, esqueço. Depois desta crônica, ele
publicou uma sobre Pedro Nava e a última se despedindo- dizia que estava
cansado, ia pessoalmente levar o texto até a Av. Brasil, de táxi.
Bom, a Cristiane tinha mais de um amor. Drummond sabia que
eu tinha uma paixão, um caso de amor clandestino, ele conhecia bem isto, vocês
sabem. Ele também sabia, porque eu contava minha vida, que um amigo norte
americano costumava tomar café da manhã comigo. Pois bem, a estória é de uma
moça que recebe amigos em casa.
Não o questionei. Acredito que estava enciumado e
ressentido, dava sinais de que estava apaixonado por mim e eu fugia, fugia
literalmente, o enganava sobre meus horários de trabalho, dizia que trabalharia
o dia todo, quando ele perguntava o que eu iria fazer no dia seguinte. Levei um
susto quando ele contou que terminou com a Lygia! A amante de 30 anos!
Mas, o término durou pouco, porque ele adoeceu de uma
infecção urinária e eles voltaram.
Ele dizia que de manhã a Dolores, esposa, cuidava dele e de
noite ele cuidava dela, dava remédios. Dormia tarde, tomava um licorzinho e
ouvia músicas. Me telefonava nestas horas- uma vez ligou meia noite e meia, eu
não estava, minha irmã atendeu. Eu não queria feri-lo com meu desamor, preferia
fugir. Eu o amava como um amigo especial, nada além.
No final da crônica ele diz: posso dar uma espiadinha no
apartamento?
Querendo dizer que ele também queria frequentar minha casa.
Ou meu coração imobiliário- onde cabiam vários amores.
O americano era apenas amigo, era muito solitário e me
ligava perguntando se poderia ir para o breakfast
e para que eu jogasse o “I Ching” para ele. Estava apaixonado por uma moça. É o violinista, contei outro dia, que fez um recital
para mim no dia 16 setembro dia do meu aniversário. Deve ter sido em 84, ano da crônica, que foi publicada em 25 de setembro,
Tad Lawer, era o Spalla da OSB na ocasião. Ganhei um
presente de luxo.
Ah! Ele esteve na minha casa uma vez. Trouxe de presente uma
gravura de Renina Katz, tomamos um chá inglês com docinhos comprados com
carinho para ele. Neste dia me contou sobre uma quantidade enorme de paqueras
dele- não anotei, esqueci. Era muito safado- a palavra é esta- não exagero. O
teor das conversas dele comigo no telefone me encabulavam. Ele dizia: Mas você
não é psicanalista? Eu respondia: Mas tenho alma de poeta, Drummond.
Conto sobre este chá na crônica “O poeta frugal”.
2 comentários:
Drummond deixou marcas em todos nós...lembro dele caminhando no calçadão nas manhãs.Posso imaginar o quanto de nostalgia bate no seu peito..pura poesia ter conhecido esse poeta maior!
bjins carinhosos diretamente do meu Cotidiano.
:)
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