terça-feira, setembro 20, 2011

Drummond, sua filha e eu



Monólogo que estreia na quinta-feira revela correspondência entre Drummond e sua filha - O Globo


Drummond e Maria Julieta

Lendo esta reportagem, lembrei do meu encontro com Drummond e Maria Julieta.

Não lembro o ano exato, foi lá por 83, acho. Eu subia a rua Farme de Amoedo e esbarrei com os dois em frente à loja Forma. Carlos, era assim que gostava que o chamasse, me corrigia quando chamava-o de Drummond, que eu preferia, afinal...
 Bom, Carlos nos apresentou e disse: 
- “Minha filha, Elianne tem dois namorados- (é uma brincadeira dele porque eu tinha realmente dois “amores”, mas não namorados).
Eu, sem graça, era a primeira vez que via a Maria Julieta, digo:
- “Que nada! Não tenho namorado, é brincadeira de seu pai.”
Maria Julieta:
- “Papai sabe muito bem que quem tem dois não tem nenhum."
IH!...
Ele: - "Elianne, você que é psicanalista, me diga, acabei de comprar uma cadeira aqui na Forma, o que significa isso?"
Eu: - "Ah! Drummond, pare com isso, sei lá..."
Maria Julieta, rápida no gatilho:
- “Comprar cadeira é pra ficar ereto”.
Sorrisos e nos despedimos.

Drummond era jocoso e divertido. Quem o conheceu sabe disso. Havia sempre uma malícia no ar.

Pois é, depois a Maria Julieta adoeceu seriamente e ele se entristeceu. Eu o encontrava a caminho da casa dela, que ficava perto da minha, na rua Barão da Torre. Um dia, ele disse que ela sofria muito com dores, usava colchão de água. Muito triste um pai ver isso.

Quando ela faleceu, eu esperei uns quatro dias e liguei. Ele parecia tranquilo, disse que ela havia descansado, conversou comigo normalmente. Dias depois ele falece. O resto da história muitos de vocês conhecem. No enterro do Carlos conheci o pai dos meus dois belos filhos. Para quem não leu está aqui. 

Sobre insinuações de uma relação incestuosa entre pai e filha, é uma distorção enorme do afeto entre os dois- percebi claramente a cumplicidade entre eles. Quando ela diz: “Papai sabe muito bem que quem tem dois não tem nenhum.” Está se referindo a Lygia Fernandes, que ele encontrava todos os dias há mais de trinta anos na casa dela na rua Barão de Jaguaribe.

Ele me contou que Lygia o namorava há trinta anos, que saiu da casa da família para ter mais liberdade para encontrá-lo, que a visitava todos os dias e ressaltava, sempre:
- “Se você quer manter a paixão, não case.” Receita do poeta para a manter a chama.

Uma carta de Lygia aqui, li hoje. Engraçado, ele não me disse que tinha angina- disse, uma vez que ficou doente, que foi infecção urinária... Talvez porque a angina seja doença de velhos... Sei lá.

Ele gostava muito de falar no telefone de noite- uma vez me ligou depois de meia noite- eu não estava, minha irmã, que morava ainda comigo atendeu. Dizia que à noite ele colocava a mulher na cama e tomava um licor, ouvia música. Pela carta de Lygia, ficamos sabendo que eles namoravam pelo telefone. Ele disse também, que pela manhã era a mulher quem cuidava dele.

É, a vida é interessante e sofrida, nunca como esperamos- desejamos.

2 comentários:

Anônimo disse...

Delícia de encontro e de texto!

Bjs

Laura_Diz disse...

Eduardo, obrigada pela parte que me toca:) ele era delicioso no papo- rápido e malicioso. Bj Elianne