14 de junho de 2005
O marido da vizinha
Dan foi deitar à tarde, vou atrás dar um beijo e fechar as janelas.
Vejo a casa da vizinha, tão bem cuidada, tão perfeita, nunca havia visto uma casa tão bem tratada. Lembra muito a casa da cunhada de “Mon oncle” de Jacques Tati. Todos os dias eu lembro de Tati olhando da minha varanda os caminhos traçados no jardim, as plantas aparadas milimetricamente, a fonte na piscina recente.
— Coitada da vizinha, ficou viúva tão cedo.
— Por que está dizendo isto, mãe?
— Porque o marido dela morreu.
— Como você sabe que ele morreu?
— Por que eu sei? Ele sumiu.
— Você é maluca, mãe, ele pode ter viajado...
— Eu sei, pode ter ido atrás de outra mulher, pode estar doente, na cama... mas ele morreu.
— Credo, mãe, você é doida mesmo, inventa cada coisa.
— Não estou inventando, o pobre do homem amava tanto esta casa, acabou de fazer a piscina e mal aproveitou, morreu.
— De onde você tirou isto, mãe? Esta tua maluquice?
— No dia do seu aniversário, eu acordei às sete e quinze, por aí — sei a hora porque você havia acabado de sair para a escola — abri a varanda e, em vez de ver o vizinho fumando um cigarrinho na varanda esperando o táxi, eu vi dois carros na porta e gente andando pela varanda nervosamente.
— Como você sabe que estavam nervosos?
— Ah, Dan, tinha um homem que se parecia com o vizinho que andava de lá para cá, angustiado.
— Pensei primeiro que a casa tivesse sido assaltada. Betânia, quando chegou, pensou na possibilidade de a mulher ter morrido e não o marido, pensou em sequestro também, mas não havia carro da polícia.
— Você fica vigiando a casa dos vizinhos, mãe, que feio...
— É impossível não ver, filho, é como no filme do Hitchcock. Lá pelas duas da tarde, apareceu a mocinha na varanda, ela nem conseguia andar direito. As pessoas da manhã já haviam ido embora. O namorado chega e ela chora abraçada a ele um tempão. Mais tarde, a mãe aparece e eu e Betânia ficamos aliviadas — não foi ela que morreu.
— Vocês duas são malucas, mãe.
— Meu filho, impossível não querer saber o que houve. Eu gostava do vizinho só de ver, eu ficava namorando a casa com ele, o jardim impecável... Não estou dizendo que paquerava o vizinho, viu? É da casa que eu gosto.
— Não sei por quê, casa mais cafona, toda arrumadinha.
— É o que ela representa, filho. Você não entende ainda destas coisas.
— Você é doida, quando fizeram a piscina, disse que a filha deles ia casar, agora que o pai dela morreu...
— Ainda acho que ela vai casar. Depois te conto.
PS: Esta crônica é baseada em fatos verídicos, conto o final depois no II, alguns de vocês já conhecem o fim da história.
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