segunda-feira, agosto 22, 2005

Crônica: O marido da vizinha III












Se você não leu O marido da vizinha I e II leia para entender melhor.

Depois que o marido da vizinha desapareceu ela passou a fazer a limpeza do jardim sozinha, todas as vezes que eu abria a varanda cedo ela estava lá com a mangueira lavando as cadeiras do jardim, as calçadas.
Outro dia acordei mais tarde e não a vi, e a casa estava fechada, no dia seguinte também não. Pensei quem sabe está saindo para trabalhar, eu tenho acordado mais tarde.
Betânia chegou e eu lhe disse que a vizinha está desaparecida
-Ih, será que morreu? Ela está cada dia mais magra.
-É verdade, eu a vejo definhando daqui, será que nós duas estamos malucas, imaginando coisas...Já inventamos que o marido morreu, agora que ela não come.
-Mas é verdade, ela só trabalha, vive limpando aquela casa, tão zelosa...
-É mesmo, mas me dá tristeza vê-la agora sozinha, a filha não faz nada.
-Menina criada com manha, a mãe vive trabalhando e ela nem ai.
A vizinha sumiu e apareceu uma placa Vende-se no portão, mas está tudo lá como se a qualquer momento eu pudesse ver o vizinho fumando seu cigarrinho na varanda, estão lá as poltronas de junco, o sofá, as redes, a mesinha de centro, mas faltam dois detalhes que marcavam a presença da mulher-todos os dias ela colocava uma almofada grená na rede pequena, não está lá, e as duas espreguiçadeiras da piscina estão desalinhadas há dias, se eu pudesse ia alinhá-las.
Depois do anúncio de venda, a filha apareceu namorando no sofá algumas vezes e as luzes da varanda ficam acesas até mais tarde. Vi a faxineira cruzando o jardim, mas ninguém cuida do jardim, a piscina está começando a sujar.
A vizinha desapareceu, mas intuo que não morreu.
Sábado o rapaz da entrega do mercadinho me disse:
-A senhora soube o que houve com a vizinha da frente?
-Não, respondi assustada e curiosa.
-Foi embora, o marido morreu e ela disse que não tem mais nada para fazer aqui, veio por causa dele lá de São Paulo.
-Puxa, você está confirmando o que eu adivinhara, coitada da vizinha...
O estranho é que a casa está exatamente como antes, apenas sem vida, como se tivessem saído às pressas.

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