sábado, março 05, 2005

Drummond e eu I


O jovem Drummond. Posted by Hello



Desde o início venho lembrando o Drummond, o Carlos, tenho muito cuidado ao falar de Drummond, é uma pessoa muito especial.

Eu e Drummond nos cruzávamos nas ruas de Ipanema, ele em direção à rua Barão de Jaguaribe, eu em direção à Rua Visconde de Pirajá.

Durante anos nos cruzamos, eu dizia: “Boa tarde, poeta” e seguia, ele olhava timidamente e respondia.

Nossos horários coincidiam, lá pelas três da tarde (engraçado, é o titulo de um conto do Raduan).

Drummond, depois me contou que ia visitar uma namorada que ele tinha há 30 anos- dizia gaiato: "Se somar os anos de meu namoro e de casamento oficial dá mais de 80 anos", que era a idade dele quando o conheci.

Em 2002 a imprensa festejou os seus 80 anos, eu pensei em escrever uma carta e lhe entregar, mas aí um dia, nestes meus rompantes, eu o parei e disse que queria cumprimentá-lo pela data, ele disse qualquer coisa que não lembro- tipo: “Eu não mereço”, ele costumava dizer estas coisas. Eu o abracei e segui cheia de ansiedade em direção ao meu consultório- o pior é segurar a novidade sem poder falar com ninguém, ( lembram da piada do cara que está numa ilha deserta com a Sharon Stone?), para os clientes eu não podia contar.

Continuei mais dois anos, eu acho, só o cumprimentando, até que um dia eu estava no restaurante da Creuza, uma atriz que era dona de um delicioso restaurante caseiro na rua Barão da Torre, eu mostrava meus desenhos para ela- ela comprou uma aquarela de uma bela fatia de melancia, nunca mais repeti o desenho- quando Drummond passou, lá pelas 6 da tarde. Eu o chamei e disse que queria lhe dar um desenho. Ele olhava os desenhos e dizia: "Eu não posso aceitar, são muito lindos...você poderia fazer ilustração de meus poemas eróticos...”, eu argumentei dizendo que ficaria ofendida se ele não aceitasse, que era um prazer. Aceitou, pegou meu endereço e telefone e saiu apressado-mais apressado que ele só o Chico Buarque andando pelas ruas - este eu não tive a ousadia de parar, nunca, never, o que faria com Chico na frente? Ficaria deslumbrada e infartava!

Dez dias depois recebo pelo correio o poema “O que se passa na cama é segredo de quem ama”. Lindo poema erótico, postarei para quem não conhece. Fico sem saber o que fazer, ligo ansiosa para meu amigo Chico, ele diz: "Ligue para ele”. Telefonei e perguntei se o poema era para eu ilustrar ou era simplesmente um presente, respondeu que era um presente, mas que se eu quisesse poderia ilustrar, seria um privilégio.

Aqui começou uma bela amizade. Eu não ilustrei os poemas dele, estava numa fase de estudos intensos de psicanálise. Sobre os eróticos, ele dizia: “Não vou publicar senão dirão que sou um velhinho tarado”. Tarado não sei, mas sacana era.

Continuo outro dia contando mais.

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