sexta-feira, abril 14, 2023

O dia em que meu filho me fez chorar- crônica 2010

 








Há uma semana, meu filho de 20 anos, que está no Rio, telefonou e disse:
- Mãe, estou em frente ao Posto 9, para onde vou agora?
Eu comecei a chorar. Ele:
-Não chore, mãe, você vai voltar aqui...
Eu não parava de chorar, mal conseguia falar.
- Eu sei, mas tenho saudades, choro de saudades. Está vendo o Hotel Sol Ipanema? Entre nesta rua ai ao lado, é a Vinicius de Moraes, vá descendo e entre na 4ª rua, que era a nossa.
E seguimos, ele caminhando, eu guiando.
-Tem um bar nesta esquina...
- É o Garota de Ipanema, filho, onde o Tom e Vinícius fizeram a música, se quiser entre ai- tem a letra escrita na parede.
Ele seguiu.
- Tem um restaurante japonês aqui... Estou com sede, vou tomar uma água.
- Tome na padaria da esquina. Ainda tem a padaria?
- Tem mãe.
- Agora desço a rua?
- Vá seguindo, tem uma peixaria ai? Tipo loja com vitrine.
- Não vi, mãe, só tem butique chique.
- Você anda rápido.
- Aprendi com meu pai. Ele anda muito rápido.
- Barão da Torre agora, mãe.
- Tem uma pizzaria ai na esquina, Capricciosa, Chico Buarque frequentava ai.
- Tem duas pizzarias aqui.
- Veja se ainda existe a Delicatessen ai à direita. Comprava ai, entre, peça pão do Bento. Conheço os donos, mas não me conhecem pelo nome.
- Está muito cheio aqui... Ao lado uma loja de fotografia...
- Entre à direita agora. Tem um bar na esquina, ainda?
- Tem.
- Ao lado tem um prédio 331, pergunte se Pedro ainda mora ai.
- Pedro de quê?
- Só Pedro, todos conhecem.
Aguardo ele chamar o porteiro e ouço a pergunta.
- Não, mãe, não mora mais.
- É... a mãe morreu, devem ter vendido o apartamento. Era meu melhor amigo ai. Preciso saber dele, vou mandar e-mail, ver se responde.
- Mãe, estou me lembrando deste prédio aqui, tinha peixinhos neste lago!
- Legal você lembrar, filho, você adorava ver os peixinhos.
- Tem uma sinagoga ai?
- Não tem.
- Deve ter, você e que nem viu, anda muito rápido. Viu a vila onde morava Tiago?
- Não vi. Lembro do Tiago. Tem um centro espírita...
- Então você já está em frente ao nosso prédio, veja ai: 97. O do Tom é o 107.
- Era que andar mesmo, mãe?
- Terceiro, veja a janela.
- Pensei que fosse mais alto.
- Ai ao lado tem o 91, depois tem um prediozinho antigo, ainda?
- Tem, velhinho.
- Este resistiu. Tem uma padaria na esquina. Vire à direita. É a rua da Cinézia. O prédio dela é este entre duas lojas de material de construção.
- Estou vendo.
- A janela está aberta no primeiro andar?
- Está fechada.
- Então ela já foi trabalhar, vá em frente.  Ai na esquina tem um Joaquim e Manuel. Se quiser conhecer o restaurante Natural olhe ai à direita na rua Barão da Torre.
- Tem um outro restaurante japonês aqui. Nossa! Você conhece tudo...
- Claro, filho, vivi 30 anos em Ipanema, andava a pé, e você sabe que eu vejo tudo...
- Veja nesta farmácia à direita se tem um homem baixinho velho. Ele sabe quem você é, só dizer que é filho do Nelson Brizola. Conhecem teu pai por este apelido.
- Não tem.  Tem uma Clínica da Amil aqui.
- Do outro lado. E bares, veja o Bofetada, fui muito com seu pai.
- Não vi. Só Sindicato do Chope.
- Você está muito rápido. Não viu porque confundiu como o Sindicato, o Bofetada deve estar ai ainda.
- Esquina Visconde Pirajá.
- Entra à esquerda. Veja se tem ainda uma loja da Hering ai.
- Se tiver vou comprar uma camiseta sem mangas, estou com calor. Não tem. Tem uma Pontapé.
- Comprava sapatos ai- é ponta de estoque.
- Vá até o 156 e entre, vá visitar a Cinézia.
- 162...
- Já passou, volte. 156, do lado esquerdo da galeria tem um elevador.
- Achei o elevador.
- 3º andar, sala 307.
- Cheguei mãe:  Instituto de Psicanálise...
- É ai, ela vai adorar te ver.
-Tchau, mãe. Depois te ligo.

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