sexta-feira, janeiro 11, 2008

O Amor nos Tempos do Cólera- a traição


Emanuel, meu amigo, sabendo que eu detestei o filme, me enviou este texto, que eu adorei- diz o que eu não disse claramente nos posts anteriores- Eu acho que para fazer um comentário maior a gente tem que tomar mais cuidado, saber quem são os atores todos, o que o diretor já fez... eu estava por fora, eu nem sabia quem era a inexpressiva Fermina, aliás, continuo sem saber. Quanto à Fernanda concordo, acho que a direção coloriu demais a louca, (as cenas anteriores foram boas), não só na maquiagem, que foi horrível no filme todo, mas no exagero. Lembrei do 'Chaves', da D. Florinda quando envelheceram a Fermina. Triste ou cômico, você escolhe.
E o nariz do moço incomodava ver, eu me senti incomoda no filme todo.
Bom, leiam aqui:

QUANTO TEMPO VOCÊ ESPERARIA PELO FINAL DE UM FILME?

Por CARLOS ALBERTO MATTOS
24/12/2007

A história de amor de Gabriel García Márquez com o cinema começou nos anos 1950, quando ele estudou no Centro Sperimentale della Cinematografia, em Roma. Desde então, escreveu e ensinou a escrever roteiros, teve vários de seus filmes transpostos para a tela, ajudou a criar a Fundação do Novo Cinema Latino-americano e até arriscou-se como ator em alguns filmes. Esta, porém, é uma história de amor muito triste. Há mais de 50 anos, Gabo espera em vão ser correspondido. Mas o cinema insiste em maltratá-lo, interpretá-lo mal e virar as costas para a magia de sua literatura.

A rigor, nem os cineastas amigos, profundamente identificados com seu universo – como Ruy Guerra e Tomás Gutiérrez Alea –, conseguiram aquecer a relação. Há no realismo mágico e no romantismo alucinado de Gabo uma qualidade que parece irredutível à brutalidade da imagem. A delicadeza de sua imaginação necessita da distância que a leitura imprime. Quando transformada em metáforas visuais e arroubos de encenação, a magia se despedaça. O cristal vira vidro vagabundo.

Amor nos Tempos do Cólera é um desastre ornamental de grandes proporções, daqueles que arrastam tudo o que está em volta. Difícil saber onde estão os maiores equívocos. Se na produção que concebe cada cena com o esmero plastificado de uma minissérie de televisão. Se no roteiro de Ronald Harwood, que trata a história de maneira tão literal a ponto de não considerar diferenças fundamentais entre as linguagens literária e cinematográfica. Se na direção de Mike Newell, que torna o patético simplesmente ridículo, como é o caso das transas “acidentais” que abrem caminho para a devassidão de Florentino Ariza. Se na direção de arte, que entope o espaço cênico de plantas, papagaios e cores berrantes para nunca deixar dúvida de que estamos no paraíso tropical da latinidade caricata. Se, ainda, nos descaminhos de identidade de um filme falado em inglês, mas com uso freqüente de expressões latinas para dar um certo “som local”.

O filme só não soa cômico quando soa piegas. Nem o talento de Javier Bardem consegue insuflar alguma legitimidade romântica a um personagem que se arrasta pelo filme como se carregasse um piano nas costas. E, convenhamos, contracenar com a inexpressividade de Giovanna Mezzogiorno (que vive a “impossível” Fermina) e os exageros de John Leguizamo pode ser mais pesado que um Steinway de cauda. Nem mesmo Fernanda Montenegro escapa à enxurrada, tendo que repisar clichês de velha louca para cumprir o que o papel exigia.

Uma investigação rigorosa desse delito fílmico pode apontar, ainda, outros culpados: o maquiador, por exemplo, que errou todas as medidas de envelhecimento e criou uma prótese nasal pavorosa para o ator Unax Ugalde passar-se por Bardem jovem. Ou o montador, que deveria ter insistido mais para cortar uns 30 dos 140 minutos totais. A certa altura, o espectador menos condescendente tem que confrontar outra versão do slogan: “Quanto tempo você esperaria pelo final de um filme?”

A globalização do cinema de espetáculo é uma tendência irreversível, a gente sabe. Mas essa inacreditável adaptação literária exemplifica o que de pior pode advir: profunda incompreensão de uma expressão regional e recursos reunidos atabalhoadamente para explorar uma grife de sucesso. Para os milhões de leitores fiéis de García Márquez, um filme como esse pode ser apenas mais uma traição. Para o próprio Gabo, é outro adiamento trágico de um final feliz com sua Fermina, o cinema.

PS:(Laura) É isto ai. :) Vou ler mais este C Alberto, não conhecia.

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