domingo, setembro 09, 2007

Mudanças ao vento




É estranho, vai fazer, no fim do ano, cinco anos que me mudei para Natal. Foi uma mudança radical. Vim com esperança de uma vida mais tranqüila, perto dos irmãos homens, e nordeste, para mim, era sol, cordialidade, calor.
A minha vida mudou muito. Por dentro e por fora. Vivi anos no Rio, convivendo com as mesmas pessoas, no mesmo espaço. Estudo, trabalho, praia, cinema, exposições, 'vernisagens'. Trabalhava até dez da noite. Dormia muito tarde, acordava tarde. Vivia cansada. Coisas, como acordar cedo, antes impensáveis, acontecem agora.
Acredito que sou muito sensível aos fatores externos. Hoje acordei pensando nisto. No calor, eu fico mais animada, saio mais, no frio, me encolho. Quando venta, fico angustiada, o seu canto me aflige, me dá dor de cabeça. Comecei o ano descendo para a piscina de manhã cedo, agora nem tenho descido, o vento me incomoda, felizmente entrei para a Yoga, senão...tenho dores pelo corpo, se não me exercito, fico flácida. Odeio a sensação de decadência, de estar murchando, envelhecer é ruim, sim, quem diz que não é, está negando. Um dia pode ser, que eu me entregue, mas vai ser difícil. No ano passado eu estive muito depressiva e me deixei cair, me diziam: "Está muito magrinha"... Eu dizia: "Ficando velha, né?" E nem estava aí. Mas reagi, quis ficar bonita para alguém, fiquei melhor do que antes. Milagres não existem, eu faço o melhor que posso- e não posso muito não, sou bastante devagar.
Estar em casa sozinha me faz mais equilibrada, estar com outros num espaço pequeno- que é o meu, me faz outra, fico meio perdida, meio sem referências- estou exagerando, óbvio, mas deixo de fazer o que gosto, fico num vai-vem que não leva a lugar algum. Não consigo escrever o quanto gostaria. Eu aprendi a escrever ouvindo a Tv da sala, com filhos entrando e fazendo perguntas, mas fico irritada- e odeio ficar irritada. Meus filhos são muito bons, eu não quero ser uma mãe insuportável- há dias em que pego muito no pé de Dan- ele é muito desorganizado e me exaspera com a bagunça. Acho que é temperamento, não adianta querer que seja organizado. Tudo dele é bagunçado. É ansioso. Lembra demais o pai- o meu ex ficava tipo bicho enjaulado em casa, ainda bem que não odeio o meu ex, senão... eles se parecem muito. Dan vê Tv(Discovery, desenhos animados, adora os "Simpsons"), fica no Pc, mas é a presença mais forte em casa, Luc é silencioso, mesmo quando toca guitarra, toca baixinho. Eu era assim. Minha mãe dizia: "Quando Elizabeth chega começam os ruídos pela casa, a outra nem parece estar em casa".

Estas últimas semanas têm sido confusas: primeiro foram as férias dos meninos, meninos a circularem por aqui. Bom, as aulas recomeçaram e os dois ficaram doentes em casa com virose, primeiro um, depois o outro. O apartamento do Rio, que estava alugado, foi entregue, fico sempre angustiada, é um dinheiro que não entra. Resolvi vender. A angústia aumenta, misto de luto e ansiedade. Penso racionalmente: não vou voltar agora, talvez nunca mais, se os meninos forem fazer um doutorado poderão fazer em SP, ou mesmo no Rio, sei lá. Poderei comprar um espaço para nós aqui, viver com mais conforto. Colocar os dois pés em Natal é difícil, mas eu comecei a atender no consultório e não posso brincar com os clientes. Preciso me decidir, esta ambivalência não leva a lugar nenhum.
O livro com os contos precisa sair, tenho muitos contos, e cada dia faço mais. Estes dias estive relendo, revendo, sempre se mexe mais e mais, é um trabalho inesgotável. Lembro Sísifo.

E ontem vi um trecho grande, final, de 'Cyrano de Bergerac'* e pensei que eu sou um tanto como Cyrano- vivo a cantar meu amor em prosa e verso. O amor ali contado pode ser o amor virtual, fiz esta leitura. Será que no amor virtual o outro nos amaria como Roxanne amou Cyrano?
Pois é, mas foi tarde. Acho que eu sempre chego tarde.
Ele diz num momento:" Eu sou tudo e não sou nada". É por aí.


* Meu pai adorava a estória de Cyrano, gostava de recitar versos, não fazia sempre, mas lembro.
Gérard Dépardieu está excelente no papel, convincente, comovente. Um bom filme para se ver. E indispensável para quem quer saber mais sobre o amor.

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