domingo, março 26, 2006

O Brasil do futuro chegou. Você sabia?











"Isto é"


REVISTA: ENTREVISTA 29/03/2006


MV Bill
A voz do morro
O rapper conta como filmou o contundente
documentário sobre os meninos do tráfico

Por Francisco Alves Filho


Ao longo de oito anos, o rapper carioca MV Bill, 31 anos, e o dirigente da Central Única de Favelas Celso Athayde, 43, documentaram em vídeo o dia-a-dia dos jovens que vigiam o morro para os traficantes. Das 90 horas filmadas, resultou o filme Falcão – os meninos do tráfico. “O nosso objetivo é discutir essa questão de forma aberta, dando voz a todos. Ou fazemos isso ou não haverá futuro”, diz MV Bill. Ele recebeu ISTOÉ na favela da Cidade de Deus, onde mora, para falar sobre os bastidores da produção do documentário e a sua repercussão após ser exibido, numa edição compacta, pela Rede Globo. Com o documentário, MV Bill espera produzir “uma comoção que salve novos jovens do mesmo genocídio que está em curso nas comunidades pobres”. O genocídio é a guerra do tráfico, feita de batalhas travadas com a polícia e de confrontos entre as quadrilhas dos próprios traficantes.

MV Bill admite ter tratado com os chefes do tráfico por onde passou para conseguir filmar. “Sem isso, é impossível desenvolver qualquer projeto na favela”, diz ele. Para fazer Falcão – os meninos do tráfico, o rapper e Athayde se expuseram a riscos. E se emocionaram com as histórias e sonhos de seus personagens reais. Essas histórias estão no livro homônimo ao documentário que acaba de desembarcar nas livrarias (editora Objetiva). Apesar de serem oriundos do hip-hop, Bill e Athayde não pensaram duas vezes em fazer uma parceria com a Rede Globo, muitas vezes criticada pelo movimento. “A vida inteira brigamos por oportunidade e espaços dignos. Não ocupá-los é burrice”, diz o rapper. Um número impressionante confirma o quanto é urgente atacar o problema: dos 17 jovens ouvidos no documentário, somente um ainda está vivo.

ISTOÉ – Como foi circular pelo mundo do tráfico?
MV Bill – Não é que eu tenha conseguido entrar naquele mundo, eu pertenço àquele mundo. A relação com esses jovens não foi uma relação de repórter com entrevistado, mas uma troca de idéias.

ISTOÉ – Eles confiaram?
MV Bill – Eles se sentiram confiantes. Não houve câmera escondida, tive até dificuldade para cobrir os rostos das pessoas porque elas falaram abertamente. Em muitos casos, os jovens viravam os produtores do documentário, até prendendo o microfone de lapela em alguém. Em uma das entrevistas, o microfone de lapela está pendurado em um fuzil, um AK 47.

ISTOÉ – Alguém deu garantias de que nada aconteceria?
MV Bill – Não há segurança de nada. A minha única segurança é a confiança e a convicção de que estou fazendo a coisa certa, benéfica, que vai trazer ajuda para algumas pessoas. Não existe um seguro de vida. Só foi possível fazer isso graças à cumplicidade e ao entendimento daqueles jovens que acharam que esse documentário não é mais um trabalho sensacionalista.

ISTOÉ – Por que eles concordaram com a gravação?
MV Bill – Eles acreditaram que o documentário poderia mudar a vida de algumas pessoas. Eu não assumi essa ideologia há um ano, minha vida toda foi isso. Meus primeiros videoclipes, minhas primeiras aparições sempre foram relacionadas a esse assunto. É o caso de Soldado do morro (videoclipe de 1998 no qual Bill já mostrava os adolescentes que trabalham para o tráfico), que me rendeu um processo por apologia ao crime e ao qual eu ainda respondo.

ISTOÉ – Você teve que procurar os chefes do tráfico para viabilizar o trabalho?
MV Bill – Conversei com todos eles. Quando eu chegava na favela, todo mundo sabia que eu estava lá. Eu trabalho com projeto social, moro numa comunidade, é impossível fazer um trabalho desses em qualquer favela sem falar com o cara do tráfico. Isso não existe. Eu não vejo contradição nenhuma em falar com esses caras. Eu vivo essa realidade, nunca escondi de ninguém.

ISTOÉ – O que achou da repercussão do documentário exibido pela Rede Globo?
MV Bill – Muitas coisas me deixam confuso. Uma das pessoas que falaram logo após a exibição admitiu que desconhecia aquela realidade (refere-se ao autor de novelas Manoel Carlos). O documentário mostrou a distância que existe entre dois mundos. Às vezes não é uma distância geográfica, mas representada apenas por um muro, por uma cerca, por um circuito interno de tevê.

ISTOÉ – O cineasta Cacá Diegues também se manifestou.
MV Bill – O Cacá Diegues traduziu o meu sentimento ao dizer que “não é a favela que é o problema do Brasil, mas o Brasil é que é o problema da favela”.

ISTOÉ – Você passou por situação de risco?
MV Bill – Eu não quis privilegiar as imagens de mais violência, de mais tiro ou de mais ação. Tinha essas imagens, mas não era esse o meu foco. No livro, tive a oportunidade de detalhar, de dividir com o leitor o que sentia em cada local.

ISTOÉ – Como assim?
MV Bill – Teve um momento em que eu estava num prédio, numa comunidade da região Sudeste, um local conhecido como Predinho, que era o lugar onde as pessoas usavam drogas. Nesse lugar eu me dei mal, a polícia me deu cacetada na cabeça, cheguei a ficar com um corte. Na época, eu não tinha tanta visibilidade, não podia nem argumentar com os policiais. Tive que pegar minhas coisas e sair voando, como se fosse bandido também.



Meu caro amigo,
se você desconhecia a realidade da favela, se ficou muito surpreso, você não sabe o que está acontecendo no nosso Brasil, que é muito maior do que a 'aldeia global', é um Brasil sem glamour e cruel.
Vejam que absurdo o Manuel Carlos não sabia... vem cá, o cara mora no Rio e não sabia? vive onde? perai...
Aqui não é diferente, TODA semana Bethânia (faxineira) senta comigo enquanto tomo café e me conta muitas histórias comoventes, onde mães jovens, quase meninas, se drogam, batem nos filhos, os abandonam, são presas, saem e voltam a se drogar.
Onde mulheres são espancadas, crianças fumam crack, gente leva tiro sem mais nem menos, facadas, é demais... é preciso acordarmos, falo de todos nós. Este povo miserável é vítima, vive numa carência terrível, há fome de tudo, abandono total.
Que Brasil estamos deixando para nossos netos????
Que vergonha! Eu era muito na minha mais jovem agora acredito que é urgente, não dá para esperar.
Vamos acordar!
Ainda tem mais esta, leiam aqui.

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