Mi madrecita
Quero compartilhar uma experiência, para mim, curiosa e interessante. Minha mãe, alguns de vocês sabem, fará 97 anos em junho. Veio morar comigo há uns 9 anos, não guardo datas- sou péssima- bom, chegou muito debilitada e intelectualmente comprometida, mal falava, respondia. Nos primeiros dias, talvez semanas, ficava mais deitada, encolhida na posição fetal- tanto que adquiriu uma postura encolhidinha e os joelhos ficaram muito comprometidos.
Eu a fazia levantar para ver filmes clássicos e seriados. Ela ama cinema, fez curso sobre quando eu era mocinha, lá em casa tinha revistas da "Nouvelle Vague"- estão na casa de meu irmão hoje, os seus livros, centenas. Comecei a colocar os filmes de Bergman, mas alguns percebia que eram muito lentos para ela nesse momento. "Morangos silvestres assistiu com atenção. Adorava o seriado inglês "Midwife". Passamos meses ouvindo gritos de mulheres a parir.
Depois se encantou com "The Crown", e de vez em quando fazia um comentário sobre o que via- Churchill, por exemplo. Vi e revi muitos trechos da série, porque sento, todos os dias, ao lado dela antes ou depois do almoço. Interessante que algumas cenas vi muitas vezes e outras eram sempre inéditas. Eu gosto de ver a Tratcher encenada pela Gillian Anderson porque adorei o "Sex education" e ela, realmente, é uma boa atriz. O contraste é incrível.
Voltando a mi madrecita- é filha de espanhol e adora dizer que tem sangue espanhol- de uns meses para cá, passei a colocar filmes da década de 50, 60, filmes com Sofia Loren, Elizabeth Taylor, Ingrid Bergman, Marlene Dietrich, Catherine Deneuve, Lawrence Olivier, Glenn Ford... esses astros daquela época. Pois surtiu um efeito incrível no cérebro dela. Outro dia revíamos "Il vitelloni", "Os boas vidas", e eu perguntei: Está gostando? Respondeu, na lata: Sim, gosto dos italianos! Hoje revendo "Ontem, hoje e amanhã" com Sofia Loren e Marcello Mastroianni, ela disse: Ela era casada com um italiano, Carlo Ponti. Houve um tempo que achava que Sofia era casada com Marcello, hoje está mais lúcida. Pois é. A vida surpreende.
Eu outro dia fui fazer o exame de colonoscopia e ao voltar a me alimentar, pós exame, desmaiei por vários segundos, a mãe sempre firme aqui. Acho que é eterna. Ela diz: São Pedro esqueceu de mim aqui.
Outras vezes diz: São Pedro está com minha ficha na mão.
Aí eu retruco, mas tem algum dos seus ex maridos que não quer que você suba. Ela ri. Foi casada duas vezes. Quando separou de meu pai aos 56 anos, foi viver em São Paulo com um primo, viúvo- durou 5 anos e fez faculdade de letras nesse período- quando separou dele foi fazer mestrado em Niterói, sempre gostou de ler, é muito culta.
AH! Na sexta disse para a fisioterapeuta: Queria ter um filho ou neto para casar com você!
Essa é D. Léa, uma figura.
AH! O segredo? Sempre comeu muito pouco, era frugal, nunca foi gulosa! Gostava de um cafezinho. Diz que o melhor do almoço é o café, também acho. Era bastante ágil enquanto vivia em casa grande, depois envelheceu bastante num apartamento.
Um comentário:
Que bom ver seu blog de novo. Vou te mandar um link pra vc ver sobre a música e a mente de pessoas com Alzheimer.
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