segunda-feira, janeiro 09, 2006

Mini conto. A carta.

Andava com pressa, estava ansiosa para chegar, a carta já devia estar lá no escaninho à sua espera, ele tinha que responder desta vez, não poderia fugir mais. Não conta para ninguém sobre eles, dirão que ela é louca. Quem entenderia este amor louco entre duas pessoas que mal se conhecem? É tudo um grande enigma, pode ser que estejam equivocados, só um encontro maior diria, ele não quer, ele não pode, diz.
No último envelope que colou cuidadosamente selou uma declaração de amor, depois, como sempre, teve medo, quis dizer que não era nada daquilo, que era só uma fantasia, mas já estava a caminho.
O porteiro adiantou:
- “Tem uma carta para a senhora”
O envelope era branco, a letra bonita, chamava-a pelo nome que mais gosta Laura- acredita que Laura possa ser mais feliz que Lílian, Laura a vitoriosa, coroada de louros, Lílian a pura, não gosta de Lílian.
Rasgou o envelope na pressa e leu:
“Laura, acabo de receber sua carta, preocupa-me a forma como conduz nossa relação, conhece minha situação, estamos muito distantes, procure sonhar menos, contenha-se. Minha vida é muito estressante, não tenho tempo para sonhar. Você está certa quando diz que quer ser feliz, merece um homem que tenha disponibilidade, você é uma mulher interessante e boa.
Um abraço, J.”.
Leu ali na portaria mesmo, o porteiro discreto sentado na cadeira nem levantou os olhos da mini TV. Ela ficou tão perturbada que subiu os três andares pela escada, não agüentaria encontrar alguém no elevador. Abriu a porta e se jogou no sofá chorando. Sabia que ele ia dizer isto, tinha certeza, nunca iria sonhar com uma mulher como ela, ousada, espontânea, aberta. Quer ficar a vida toda naquela relação morna, cada um virado para um lado, como já disse uma vez: “A cama é grande, cada um vira para um lado”, ela nunca aceitaria um homem ao lado deitadinho na mesma cama sem falar com ela. Que se dane!
“Contenha-se”, como se conter? Como evitar o amor? Estava tão bem, mortinha por dentro, sem sonhos, ele veio e a despertou, agora quer que se contenha, dane-se!
“Você é boa”, " ah, boa... Esta é boa! Eu boa? Só se for de cama!"
Chorou até cansar, lembrou dele, da última vez que se viram, do quanto se entregou, dos olhos dele assustados e percebeu que ali havia o prenuncio da fuga. Nunca mais quer vê-lo, ridículo, acabou, detesta homens fracos, ama os sonhadores, os visionários, os destemidos, acabou.
Ainda havia um resto de sol lá fora, vestiu um short, um tênis e foi caminhar na praia.
Desceu pela escada, desta vez saltando os degraus, saltando no tempo.
Disse ao passar pelo porteiro:
_ Seu Zé, na volta vou trazer um pãozinho fresco para o senhor, vou dar uma volta, ver o por do sol, até logo.













PS: Esta historinha é ficção, não vão pensar que aconteceu :) fiz um mix e saiu isto.
o meu porteiro do Rio é o Seu Zé, ainda existe, está lá, gosto dele, quando comprava pão, dava para ele ao passar na portaria, ele está lá desde que fizeram o prédio, uns 40 anos.
Ih... será que sou boa? hihihi eu acredito que a gente faz estas coisas para nos sentirmos bem, é isto.

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