quinta-feira, maio 05, 2005

O homem aprisionado e Juarez Machado.


Juarez Machado. Posted by Hello



A Leila, do cadernos da Bélgica, me convidou para responder um questionário literário. Começa com a pergunta “Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?”
Para quem não sabe- tenho leitores muito jovens - “Fahrenheit 451” é um filme dirigido por François Truffaut e com Julie Christie no elenco. É um filme/livro* de ficção em que todos os livros devem ser queimados, porque propagariam a infelicidade. Há uma perseguição feroz aos livros, até que um bombeiro começa a questionar o porquê da destruição dos livros.
É um filme de ficção muito interessante e assustador.
O título Fahrenheit 451 é uma referência à temperatura que os livros são queimados.

Fiquei pensando e achei estranho escolher um livro, melhor seria um personagem, aí me lembrei do meu querido Juarez Machado.
Juarez tem um livro que saiu na década de 70, inicio, onde um personagem tenta de todas as maneiras sair do quadrado que o contém, o emoldura. Juarez com a criatividade fantástica que tem, faz a cada página um desenho onde o homenzinho se vira de todas as formas para iludir o enquadramento. Dá para imaginar que no fim ele sai, consegue sair, mas que ilusão... continua preso. É a vida. Nós criamos nossa prisão.
Eu estudava em Curitiba no Colégio São José, que fica ainda na Praça Rui Barbosa. Juarez fazia muito sucesso na época, saia muito nos jornais, era um jovem de Joinvile, que estudava artes plásticas em Curitiba e fazia um quadro de humor com Ari Fontoura na TV Iguaçu. Era hilário. Ari Fontoura fazia um deputado politicamente incorreto e Juarez um 'play boy' de cabelos compridos- coisa rara na época, tinha um cabelo louro muito lisinho, olhos azuis, azuis. Uma amiga de ginásio se apaixonou pelo 'play boy' e quis conhecer o Juarez. Eu o via passar pela praça na hora que eu saía da escola, e um dia corri e disse que gostaríamos de ver os desenhos dele. Combinamos o dia e lá fomos nós, umas quatro meninas, `a pensão que ele morava na rua 24 de maio. Quando minha amiga viu Juarez de perto se desencantou e eu me apaixonei. Sabe aquelas paixonites de menina moça que não quer nem lavar as mãos depois que cumprimenta o amado? Pois eu era assim. Caminhava com ele até a pensão e seguia o caminho em êxtase, lembro do cheiro do cigarro, sempre fumou muito. Eu tinha 15 anos. Aos 16 meu pai resolver mudar-se para Cabo Frio e foi um sofrimento enorme. Ganhei um desenho na despedida. Juarez namorava Gia, sua musa, dedicava todas as esculturas e desenhos para ela. Eu me sentia tão pequenininha, tão pouco mulher para competir com ela que guardei meu amor em segredo, de longe eu lia tudo que saía sobre ele na imprensa, já sabia que ele estava no Rio, e acompanhava as noticias. Ele se casou com a Gia e teve dois filhos.
Um dia, já morando no Rio, recebo de uma loja onde havia comprado uns móveis o convite para a exposição de Jorge de Salles, era apresentado por Juarez Machado. Peguei meu pai e fui até a loja que ficava na esquina da Praça Gal. Osório em Ipanema, pertinho de casa, me apresentei ao Jorge- ficamos muito amigos- e esperei Juarez, mas nada dele chegar e eu já com pena do meu pai que era avesso a estas festas, o lugar estava lotado- Jorge é a pessoa que mais agrega gente em torno que eu conheço- resolvi voltar outra hora.
Encontrei Juarez uns dias depois, ele tinha o atelier ali na praça, em cima da OCA, no escritório do Sergio Rodrigues, o arquiteto. Passamos a nos ver ali no atelier, eu ficava vendo ele pintar e desenhar, ele fazia uma tira no Jornal do Brasil de desenho nonsense, saia aos sábados, tenho todas as tiras até hoje.
Como esta história está ficando longa, acabo outro dia, fiquei com saudades de Ju, faz uns 3 anos que não o vejo.

*12:00 hs. Nemo Nox me corrigiu dizendo que o filme "Fahrenheit 451" é baseado no livro de Ray Bradbury, publicado mais de uma década antes do filme de François Truffaut. Eu não me lembrava do livro, como digo sempre: não confie em ninguém com mais de 50 anos, muitas lembranças nossas são vagas. obrigada Nemo, valeu.

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