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quinta-feira, julho 31, 2014

"Primeiro levaram os negros..." é sempre bom lembrar


No primeiro dia
Bertold Brecht
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.

sábado, março 01, 2014

O ator perfeito








Sobre Philip Seymour Hoffman:

"...And, finally, Smith gives us the dead swimmer's haunting summation of his existence:
'I was much too far out all my life 
And not waving but drowning.'*
The phrase is compelling because we are, all of us, much more distressed than the people around us realise. And, the flipside of this same coin, other people are much more distressed than we allow ourelves to discover. We don't pick up on the quiet references to 'difficulties', we assume things must be fine, because it's just so much more convenient that they be so.
We were not part of this actor's life. Many of us are spared his specific troubles. But we are, in some corner of our souls, still a little bit like him - and so are all the people we know; not waving butdrowning."
...
* Poet Stevie Smith 

terça-feira, maio 14, 2013

Mulher





Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou. Adélia Prado

quinta-feira, maio 02, 2013

Rimbaud - o rebelde (revista Cult)






Rimbaud aspirava à síntese de rebelião e revolução e queria a liberdade total e intransitiva.
Sua obra foi marcada pelo inconformismo absoluto

       Claudio Willer

Leia o texto na íntegra aqui.

quarta-feira, março 14, 2012

A Chuva de Maria, de Martha Galrão


Daqui


Hoje é o dia nacional da poesia, vamos aos poetas.
Estou lendo o livro de Martha. Já a citei aqui, é minha poeta preferida, contemporânea. Tem uma simplicidade cativante e um lirismo que vem do feminino e da beleza de uma vida sem artifícios e muito afeto. Conheço Martha há alguns anos e venho acompanhando seu despertar na literatura- fico feliz quando faz um novo livro. Merece.
Com vocês alguns poemas:




Palavras

Uma palavra lasciva: delícia,
uma palavra dengosa.

Duas palavras alegres: peteca e
manhã.

Uma palavra tensa:
tempo.

Uma palavra firme: chão.
Duas palavras tristes: dor e saudade.

Uma palavra livre:
beija-flor.




A chuva de Maria

Tudo por fazer é água
que Maria acolhe
e carrega no cesto.
Chove, Maria
chora o leite derramado

lambe as letras
sorve o leite
pranteia seus amados,
Maria.






Água


Água
transforme minha dureza
em correnteza

Água
transforme minha queda
em cachoeira

Água
transforme meu medo
em corredeira

Água
me transforme em vapor
me alivie por inteira.

quarta-feira, janeiro 04, 2012

O poeta da natureza- Manoel de Barros




"Eu vi a manhã pousada em cima de uma pedra! Isso não muda a feição da natureza?" 
 Manoel de Barros.


"A maior riqueza do homem é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou – eu não aceito.
Não agüento ser apenas um
sujeito que abre portas,
que puxa válvulas,
que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora,
que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.

Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.
Eu penso renovar o homem
usando borboletas".

Nosso maior poeta vivo. Vida longa para ele. 

segunda-feira, agosto 01, 2011

A chuva de Maria






Lançamento do livro A Chuva de Maria
sexta, 5 de agosto às 18:00
Local: Livraria Cultura Shopping Salvador




A Chuva de Maria por Gerana Damulakis



Poesia é a expressão do belo por meio de palavras habilmente entretecidas.
Jorge Luis Borges

O que traz a reunião com os poemas de A chuva de Maria? Primeiramente, traz uma missão cumprida, revelada no ato de buscar palavras precisas e necessárias ao ofício de poeta. Isto valoriza a essência do ofício. Mas, não apenas isto. Consciente, então, do poder, mágico e bélico, da palavra, a poeta Martha Galrão expressa, por meio dela, a sua proposta poética e, ainda mais, a sua proposta existencial. A poesia é, portanto, um ser vivo (”confundo lábios e letras”), e há um constante paralelo com o feminino, pois a poesia é feminina no universo das palavras de Martha. E as palavras? Vale reparar no gênero das palavras escolhidas.

Palavras

Uma palavra lasciva: delícia,
uma palavra dengosa.

Duas palavras alegres: peteca e
manhã.

Uma palavra tensa:
tempo.

Uma palavra firme: chão.
Duas palavras tristes: dor e saudade.

Uma palavra livre:
beija-flor.



Seu espaço lírico é símbolo da vida: a água, tal como chuva – haja vista o título -, tal como rio, tal como lágrimas, a água está em imagens repetidas, tendo sua constância como sugestão, pois que levanta indagações ao longo dos poemas, revelando marcas que irão distinguindo a poeta.


A chuva de Maria

Tudo por fazer é água
que Maria acolhe
e carrega no cesto.
Chove, Maria
chora o leite derramado

lambe as letras
sorve o leite
pranteia seus amados,
Maria.


Mais emblemático ainda é o poema, cuja última estrofe suscita em mim uma vontade de largar a pose de avaliadora e gritar: “Lindo!”



Água
transforme minha dureza
em correnteza

Água
transforme minha queda
em cachoeira

Água
transforme meu medo
em corredeira

Água
me transforme em vapor
me alivie por inteira.



Assim, também escrevi “Lindo!” ao lado da seguinte estrofe: “ Faço cipó de letras/ e desço./ Teço corda de texto/ e retorno./ No despenhadeiro/ marcas de unha/ e memória”. No entanto, é o instante de continuar a leitura para além da beleza. Vamos seguir.
O ser e a dialética estão expostos, ou apenas pincelados, para que sejam evidentes as aparências mais calmas e mais descarregadas de seu teor de dramaticidade. Fica exposta de imediato a voz feminina: “Eu gosto mesmo é de usar vestidos/ e saias” (o vocábulo “mesmo” confere uma ênfase ao uso de vestidos e saias, quase como uma defesa, ou enfrentamento). Contudo, fica exposta na voz que se lê nas entrelinhas, um ser apaixonado e ciente do poder da linguagem e que mostra, para quem quiser entender, um comportamento feminista (na falta de um termo mais leve e menos carregado de significados que não são os que desejo no momento), quando traz da memória as “obrigações” da mulher, tais como “sentar de pernas fechadas”. O poema abaixo é emblemático:



Quando nasceu, o médico disse:
nasceu uma miss.
Com sorte, contrariou a profecia
mas nasceu mulher, isso se via.
E contra fatos há argumentos
'menina bonita da perna grossa
vestido curto papai não gosta'.

Foram muitos os ensinamentos
sentar de pernas fechadas
não ser muito justa a saia
não brincar de ousadia
fechar a porta, Maria,
que o boi já vinha.

A avó lhe pedia
em cartões cheios de anjos
pra ser sempre uma boa menina.

Nem sempre ela podia.



Em tempo algum Martha se desvincula de sua consciência feminina; na verdade, é uma consciência entranhada na sensibilidade, ao modo de uma Adélia Prado, e de um poder lírico que, se agudo por um lado, por outro traz retratos críticos, ao modo de Carlos Drummond de Andrade, acrescentados do requinte de uma Cecília Meireles.
De Adélia Prado (porque desde Gilka Machado não se lia poemas tão deliciosamente sensuais, já que Adélia praticamente reinaugura o lugar sensual dentro do poético), a carga sensual abertamente promovida por palavras diretas e fortes:


Fevereiro ferve
me dá febre
Me come feito homem.

Fevereiro arrepia
os bicos dos meus seios
Abocanha meus sonhos.

Fevereiro tem fome
não tem piedade
Me consome.

Fevereiro, me deixa.



De Drummond a ironia que pode ser apontada em vários exemplos, inclusive no poema supracitado que começa com os versos: Quando nasceu, o médico disse:
nasceu uma miss.
De Cecília, elegância ao criar uma atmosfera psicológica para decodificar os valores femininos (reparar na lista: “sentadas”, “plantadas” e “caladas”) do poema abaixo e na ludicidade requintada com a qual Martha conduz seus versos para o belo final.
O Peixe, as Mulheres, a Menina e a Flor

À beira da água do rio
eu vi três mulheres sentadas
três mulheres plantadas
três mulheres caladas
à beira da água do rio.

Beirando a água do rio
uma menina de cabelos cacheados
colheu uma flor amarela
para uma das mulheres belas.

À beira da água do rio
a menina deu a flor porque quis
seu nome é Beatriz.



Ouso perguntar quem seriam as três mulheres. Familiares, com certeza. Ou: “São amigas, são irmãs, são amantes, as três mulheres do sabonete Araxá?// São as três Marias?”, diria Manuel Bandeira se o intuito fosse a intertextualidade com a “Balada das três mulheres do sabonete de Araxá”, mas isso já é viagem do muito pensar em poesia.
A linhagem poética na qual Martha Galrão se inscreve é de primeiríssima água; porém, Martha escreve a sua poesia. Singular.
Por fim, resta comentar a série de monólogos (há a tentação de escrever diálogo, em lugar de monólogo, porque parece que a poeta está conversando com o leitor, usando sua voz narradora) se manifesta para contar. É uma voz íntima, ainda que audaciosa, contando e insinuando a formação de um perfil que se quer dito claramente no espaço poético.

Desamparo era a menina esperando com o coração na mão. Desamparo era a menina esperando com lágrima.
Triste e solitária, tão só, a menina só pensava e escrevia, a menina queria, como as outras crianças, esperar confiante. Mas, na espera, a menina sofria, com alma e estômago transtornados.
A menina olhava e tentava se convencer que alguém viria.



Martha estabelece um diálogo que se dá através da contensão, ou seja, do silêncio citado ou almejado, e, de seu oposto, da palavra buscada e achada.
Reflexo e projeção, portanto. Surgem daí o emocional e o existencial, ambos especulados a partir das possibilidades que cada palavra demonstra na criação (ou criatividade) poética.
Mais um tanto sobre a palavra, pois que ela domina a reunião de poemas: ao discorrer sobre a potencialidade da palavra – matéria-prima dos textos – os versos fazem ressoar a dialética da visão própria da poeta, igualmente fazem ressoar a magia da realidade que dá forma à perspectiva de vida de Martha.
Cada poeta faz seu caminho: construir poemas metalingüísticos, examinar o lugar de cada palavra, sua precisão, seu poder e sua dubiedade para, então, dizer poeticamente sobre a vida, este é o caminho de Martha. Caminho árduo o da poesia, caminho alcançado o de Martha Galrão.



Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas.
Clarice Lispector



PS: escrevi “Genial” ao lado do poema abaixo:
Do coração
à boca
o rastro
é curto.

Engulo palavra
Cuspo fogo
Engulo fogo
Palavra, eu cuspo.


Mais Muadiê Maria

terça-feira, junho 23, 2009

Poema de Pim: Miosótis






Miosótis

Perderam-se vidas
para te colher
Miosótis abissal

Pim*


*Um amigo inesquecível.